sábado, 16 de agosto de 2008

Espera.





Há muito que a cadeira está vazia.
Há muito que ela deixou de lá se sentar.
Ficaram lá debaixo os sonhos enterrados, as melodias de sempre a serem empurradas bem para o fundo.
Sem o molde do corpo dela, ficou só a cadeira, a sufocar qualquer coisa que a vida se foi esquecendo de ser.

Antes ela sentava-se ali todos os dias. E esperava. Havia sempre algo por que valia a pena esperar. Porque ainda não lhe tinham dito a verdade. E então ela acreditava, talvez porque o céu fosse quase sempre azul e o mar lhe fizesse prova de confiança de cada vez que lhe vinha beijar os pés.

Mas há muito que a cadeira está vazia agora.
Nota-se talvez na própria paisagem repleta do cinzento da ausência, e cheia de um nada por que ela pudesse esperar.
Foi exactamente ali que ela se desiludiu. Com ela mesma, com os outros, com as esperas em vão e até com o próprio mar que ás vezes se esquecia de a vir acariciar. E era sempre tão pouco o que ela esperava.
Muitas vezes apenas que os outros soubessem compreender e receber o que ela tinha para dar. Porque questionava-se frequentemente o que fazer com a ternura que tinha para dar...
Penso que fazemos isso quando o espaço à nossa volta não a parece conseguir conter. E isso entristecia-a. E fazia com que abandonasse a cadeira em que costumava sentar-se.

Cansou-se de estar ali. A cadeira abandonada confundiu-se com o cenário. Os dias foram deixando de se lembrar das coisas pequeninas, das aparentes insignificâncias. Aquelas pelas quais ela se sentava e esperava.

Agora não. Não vale a pena esperar pelo que ela sabe que não vai chegar. Talvez o lugar na cadeira nunca tenha sido realmente dela. Talvez a vida se tenha mesmo esquecido de acontecer mais vezes.

Foi ela que me contou esta história. Foi assim que a senti. Esperei...
Mas há muito que a cadeira está vazia.